A glória imensa que gozam no céu os religiosos

A glória imensa que gozam no céu os religiosos

A glória imensa que gozam no céu os religiosos

Omnis qui reliquerit domum, vel fratres, aut sorores, aut patrem, aut matre… propter nomem meum, centuplum accipiet, et vitam aeternam possidebit – “Todo o que deixar por amor de meu nome, ou os irmãos, ou as irmãs, ou o pai, ou a mãe… receberá o centuplo, e possuirá a vida eterna” (Mt 19, 20)

Sumário. O paraíso é chamado coroa de justiça, porque ali o Senhor premia conforme o merecimento de cada um. Considera, portanto, qual será a glória reservada aos bons religiosos que sacrificaram tudo por amor de Deus e em particular a própria vontade que é o sacrifício mais agradável. Um religioso ganha pela observância de sua regra mais em um mês do que uma pessoa secular ganha num ano inteiro por todas as suas mortificações e orações.

I. Considera em primeiro lugar que o religioso, morrendo em sua ordem, dificilmente se condena. Diz São Bernardo: “É fácil o caminho da cela ao céu. Raras vezes alguém desce da cela ao inferno.” A razão disso é, como diz o Santo, que “dificilmente um religioso persevera até à morte se não é do número dos eleitos ao paraíso”. Pelo que São Lourenço Justiniano chamava a religião porta do paraíso, grande sinal de predestinação.

Considera, além disto, que no dizer do Apóstolo, o paraíso é coroa de justiça; porque Deus, ainda que remunere todas as nossas boas obras mais abundantemente do que elas merecem, todavia premia à proporção dos merecimentos de cada um: Reddet unicuique secundum opera eius (1) – “Retribuirá a cada um segundo as suas obras”. Disso se pode concluir quão grande será a recompensa que Deus dará no céu aos bons religiosos se atenderdes aos grandes merecimentos que eles todos os dias vão adquirindo. O religioso dá a Deus todos os bens que possuia na terra e se contenta em viver realmente pobre sem possuir coisa alguma. O religioso renuncia ao afeto dos parentes, dos amigos e da pátria, para se unir mais a Deus. O religioso mortifica-se continuamente privando-se de muitas coisas que poderia gozar no século.

O religioso finalmente dá-se a si mesmo e todo a Deus dando-Lhe a própria vontade pelo voto de obediência. A vontade própria é a coisa mais cara que temos, e é esta que Deus nos pede mais que qualquer outra coisa; pede-nos o coração, isto é, a vontade: Praebe, fili mi, cor tuum mihi (2) – “Meu filho, dá-me teu coração”. Quem serve a Deus no século, dar-lhe-á as suas coisas, mas um religioso, dando a Deus a própria vontade, dá toda a sua pessoa, de forma que com verdade pode dizer: Senhor, tendo-Vos dado a minha vontade, nada mais tenho a dar-Vos.

II. Afirma Santo Anselmo que o religioso, contanto que guarde as suas regras, adquire merecimentos com tudo o que faz: não só quando faz oração, quando confessa, quando prega, quando jejua ou pratica outras mortificações, mas ainda quando toma alimento, quando varre a sua cela, quando dorme e quando se recreia, porque fazendo tudo por obediência, em tudo isso faz a vontade de Deus. – Santa Maria Madalena de Pazzi dizia que é oração tudo o que se faz por obediência. Pelo que São Luiz de Gonzaga costumava dizer que na religião se anda num barco à vela, em que se viaja sem o trabalho de remar. Oh, quanto mais ganhará um religioso, observador de suas regras, por espaço de um mês, do que um secular com todas as suas penitências e orações durante um ano inteiro!

É possível, ó meu Deus e meu verdadeiro amador, que Vós tanto desejeis o meu bem e ser amado de mim, e que eu miserável tão pouco deseje amar-Vos e dar-Vos gosto? Para que me favorecestes com tantas graças e me tirastes do mundo para Vós? Meu Jesus, já Vos entendo: Vós me amais muito e quereis que eu também Vos ame muito e seja todo vosso nesta vida e na outra. Quereis que meu amor não seja dividido entre Vós e as criaturas; mas seja todo para Vós, meu único Bem, digno de amor infinito. Ah, meu Senhor, meu tesouro, meu tudo, desejo e anhelo amar-Vos devéras e não amar senão a Vós!

Graças Vos dou por este desejo que me inspirais; guardai-o e aumentai-o sempre em mim. Fazei com que eu Vos dê gosto e Vos ame quanto desejais cá na terra afim de que depois vá amar-Vos no paraíso, face a face e com todas as minhas forças. Eis tudo o que Vos peço: quero amar-Vos, e para Vos amar ofereço-me a padecer qualquer pena. Quero fazer-me santo, não para gozar mais no paraíso, mas para mais Vos agradar, meu amado Senhor, e para Vos amar mais durante a eternidade. Atendei-me, Pai Eterno, pelo amor de Jesus Cristo. – Maria, minha Mãe, valei-me pelo amor desse vosso Filho; vós sois minha esperança, de vós espero todo o bem.

Referências:

(1) Mt 16, 27 (2) Pv 23, 26

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo II: Desde o Domingo da Páscoa até a Undécima Semana depois de Pentecostes inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 77-80)

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